Amazônia nostra

Marília Ferreira Emmi

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    Subsidiadas pelo governo, cerca de cem famílias de agricultores italianos chegaram ao Pará em 1898. Acima, imagem da hospedaria dos imigrantes na colônia Outeiro. (Fundação Biblioteca Nacional)

    A Amazônia fica a milhares de quilômetros de distância do Sul brasileiro, para onde a maioria dos imigrantes europeus foi quando chegou por aqui. Ainda assim, muitas famílias italianas arriscaram nessa região como novo destino. Lá, um grupo de imigrantes mostrou um diferencial: pequenos proprietários e artesãos fizeram do comércio sua atividade principal.

    Eles se fixaram em Belém e Manaus, além de centros menores, como Santarém, Óbidos e Oriximiná, às margens do Rio Amazonas e de seus principais afluentes, por onde circulava o capital decorrente da economia da borracha. Houve até casos em que a habilidade artesanal evoluiu para que surgissem fábricas de calçados e bebidas. Mas muitos permaneceram exercendo atividades de menor prestígio social, como engraxates e estivadores. Os descendentes dessa leva - que veio da Basilicata, Calábria e Campânia - ainda são encontrados em várias cidades amazônicas.

    Mas a onda das imigrações na Amazônia aconteceu entre meados do século XIX e o início do XX, época em que houve um surto de riquezas produzidas pela extração da borracha. Os europeus, incluindo os italianos, foram atraídos por essa oportunidade. Mesmo após 1912, quando esse ciclo se encerrou, os imigrantes continuaram chegando. O censo de 1920 contabilizou aproximadamente 2 mil italianos vivendo na Amazônia. Mas a adaptação foi bem difícil e lenta.

    Subsidiados pelo governo do Pará, um grupo com cerca de cem famílias de agricultores vênetos, campanos e sicilianos chegou, em 1898, às colônias Anita Garibaldi, Ianetama e Outeiro, próximas a Belém. Pelos contratos, em cada uma deveria haver 200 famílias de agricultores. Entretanto, esse número foi aquém do esperado, e as circunstâncias de moradia e de trabalho não satisfizeram os colonos. Boa parte deles não se adaptou às condições adversas do local. Abandonaram os lotes e espalharam-se pelos núcleos urbanos mais próximos. Os contratos foram rescindidos, e as terras retornaram ao controle do governo do estado.

    Ambientados no novo lar, os imigrantes que vieram em diferentes fluxos garantiram que a identidade italiana não fosse esquecida por meio da publicação de jornais e da fundação de associações beneficentes, recreativas e culturais. As primeiras datam da década de 1910, mas o melhor exemplo é a Associação Civil Casa da Itália Pará Brasil. A sociedade – surgida em 1938 a partir da fusão de outras mais antigas – manteve-se firme ao longo de décadas e, em 1998, passou a se chamar Associação Cultural Ítalo-Brasileira, denominação que mantém até hoje.

    Esses imigrantes não constituíram núcleos fechados, mas se integraram à sociedade do Norte e trouxeram novos hábitos à região. A arquitetura, as artes e a gastronomia amazônicas, por exemplo, revelam marcas da presença italiana. Elas estão no Teatro Amazonas e no Teatro da Paz, além do número significativo de cantinas, pizzarias e restaurantes italianos existentes em Belém. Apesar de parecerem muito diferentes, as culturas se afinaram bem.

    Marília Ferreira Emmi é professora da Universidade Federal do Pará e autora da tese “Raízes italianas na Amazônia: pioneirismo econômico e identidade” (UFPA, 2007).

    Saiba Mais - Bibliografia

    DERENJI, J. Arquitetura nortista: a presença italiana no início do século XX. Manaus: SEC, 1998.

    Saiba Mais - Internet

    Centro de Memória da Amazônia
    www.ufpa.br/cma