Abrir clareiras nas matas e construir casas de pau-a-pique em um local totalmente estranho. Este era o primeiro passo dos italianos que chegavam ao Rio Grande do Sul na esperança de melhorar de vida. A chegada dos imigrantes estava de acordo com o que o governo imperial pretendia: importar mão de obra europeia e vender terras gaúchas ainda inabitadas para aumentar a população e a produção agrícola. De 1875 até 1914, o estado recebeu cerca de 80 mil italianos, oriundos em sua maioria das regiões do Veneto e da Lombardia.
Os imigrantes fundaram as primeiras colônias em Conde D’Eu, Dona Isabel (atuais Garibaldi e Bento Gonçalves) e Caxias. Em 1877, foi ainda organizada a colônia Silveira Martins na região central do estado. A ideia era privilegiar italianos que fundassem grupos coloniais no campo, para desenvolver a policultura e abastecer economicamente a região.
A travessia do Atlântico, que durava mais de um mês, era feita em navios sobrecarregados, por isso as doenças eram frequentes e a mortalidade elevada. Após o desembarque no Rio de Janeiro, os italianos ficavam em quarentena na Casa dos Imigrantes e depois eram transportados em vapores para Porto Alegre, numa viagem de dez dias. Quem fosse para Dona Isabel, Conde D’Eu e Caxias partia da capital gaúcha em pequenas embarcações. Já os que seguiam para Silveira Martins faziam boa parte da viagem de trem.
Quando chegavam, os imigrantes recebiam os lotes – unidades de base da economia colonial –, nos quais se praticava uma divisão etária, sexual e familiar das tarefas. Os homens tratavam da agricultura e dos animais de maior porte, enquanto as mulheres ficavam com afazeres domésticos. Dependendo da força, as crianças de 8 anos já pegavam na enxada.
O isolamento das colônias, na fase inicial, fez com que se produzisse quase tudo o que era necessário para o consumo local. O comerciante vendia o que o colono não produzia – sal, ferramentas e tecidos – e comprava o excedente colonial. As frutas colhidas nos lotes eram consumidas in natura ou transformadas em geleias e compotas, que podiam ser escoadas para o mercado local. Em cada núcleo surgiram profissionais como ferreiros, sapateiros, alfaiates e marceneiros. Logo depois, o vinho produzido artesanalmente passou a ser fabricado por complexos estabelecimentos vinícolas.
Religiosos, os imigrantes se reuniam na hora de rezar. Por isso, as igrejas, escolas, seminários, capelas e jornais clericais eram as principais instituições culturais e políticas, em particular no mundo rural. Nos casamentos, os pais dotavam os filhos com terras e as filhas com o enxoval, composto de uma máquina de costura, uma arca com roupas, uma vaca ou uma mula. Nesse ritmo, a partir do século XX, os novos ítalo-gaúchos logo desceriam a serra e se espalhariam por todo o Rio Grande do Sul.
Luiza Horn Iotti é professora da Universidade de Caxias do Sul e autora de Imigração e poder: a palavra oficial sobre os imigrantes italianos no Rio Grande do Sul (1875-1914) (Educs, 2010).
Saiba mais - Bibliografia
DACANAL, J.H.; GONZAGA, S. (Org.). RS: imigração & colonização. 2. ed. Porto Alegre: Mercado Aberto, 1992.
POZENATO, José Clemente. O quatrilho. Porto Alegre: Mercado Aberto, 1984.
TEDESCO, João Carlos; ZANINI, Maria Catarina (Org.). Migrantes ao sul do Brasil. Santa Maria: Ed. da UFSM, 2010.
Imigração tridifícil
Luiza Horn Iotti