A Itália brasileira

Déborah Araujo

  • A gôndola de Nova Veneza está atracada em um lago artificial construído na praça da cidade. A embarcação está aberta ao público como ponto turístico. (Foto: Divulgação / Joana Nin)Nova Veneza foi a primeira e última colônia italiana no Brasil da República Velha (1889-1930). A cidade, resultado de um processo de colonização entre 1891 e 1897, tem um grande índice de casamentos entre descendentes de colonos, o que ajudou a manter uma aliança forte com a terra natal de seus ancestrais. Esta e outras peculiaridades da cidade de aproximadamente 13 mil habitantes no sudeste de Santa Catarina são apontadas no documentário Uma Gôndola para Nova Veneza, dirigido e produzido por Joana Nin, que estreia no Canal Brasil no dia 16.

    A embarcação que dá título ao projeto foi doada em 2006 pela Prefeitura da Cidade de Veneza, na Itália. Apenas mais três cidades em todo o mundo têm gôndolas doadas oficialmente pela histórica metrópole italiana: Las Vegas (EUA), Toronto (Canadá) e São Petersburgo (Rússia). A gôndola foi sugerida como pauta por uma amiga da diretora, que na época trabalhava para um programa de televisão. “A matéria não saiu porque a gôndola não navega, e foi justamente por isso que eu me interessei e fiz o documentário”, ressalta Joana Nin. A gôndola de Nova Veneza está instalada em um lago artificial na praça da cidade, com um “gondoleiro” contratado pela prefeitura apenas para tirar fotos com os turistas. “A gôndola está parada hoje porque é um monumento. Por ser a única, a questão de turista navegar acaba deteriorando o presente”, explica Giliard Gava, secretário de Cultura, Esporte e Turismo do município de Nova Veneza. 

    O documentário traz histórias dos descendentes de italianos em Nova Veneza. Seus ancestrais chegaram à região entre 1891 e 1897. (Foto: Divulgação / Joana Nin)No entanto, a embarcação foi apenas o início do encontro de uma história mais rica e interessante na cidade catarinense. “Fui descobrindo aos poucos a força determinante da cultura italiana na construção da identidade local”, declara a diretora Joana Nin. “O percentual de descendentes passa de 90%, o que é incomum em outras cidades que foram colonizadas, especialmente mais de 120 anos depois”. O casamento entre famílias de imigrantes era comum no sul do Brasil, “especialmente em colônias isoladas, por questões práticas, geográficas. No início, eles falavam, muitas vezes, línguas locais ou regionais, com dificuldade de comunicação até com outros italianos. Isso mudou depois, na metade do século XX, quando estradas e escolas brasileiras foram finalmente construídas”, explica João Fábio Bertonha, professor de história na Universidade Estadual de Maringá (Paraná).

    Além do número de descendentes, Nova Veneza se distingue de outras colônias italianas no Brasil quanto à valorização da cultura – ao menos no nível institucional – e à ligação com a Itália. O município hoje tem pacto de amizade com cidades italianas como Caravaggio (na Lombardia) e a própria Veneza. Desde 2002, o ensino da língua italiana (como segundo idioma) é obrigatório na grade curricular de todas as escolas do município. Segundo João Fábio Bertonha, para a maioria esmagadora dos descendentes de italianos, essa proximidade com a Itália é, paradoxalmente, algo distante. “A grande maioria nunca foi à Itália, não se interessa de verdade por ela e nem fala italiano. Alguns hábitos são seguidos por tradição familiar e local, mas muitas vezes o que eles imaginam ser um hábito italiano é ítalo-brasileiro, ou seja, uma mistura, uma adaptação”, completa o pesquisador. 

    “Uma Gôndola para Nova Veneza”
    Datas de exibição no Canal Brasil:
    16/09, terça-feira, às 19h;
    17/09, quarta-feira, às 17h.