A volta do pau-brasil

Bernardo Camara

  • Desde que as caravelas de Cabral aportaram por aqui, o pau-brasil está na corda bamba das espécies ameaçadas. Mas agora os europeus querem a árvore de pé. Considerada, de longe, a melhor madeira para a fabricação de arcos de violino, violoncelo e afins, a Caesalpinia echinata –  como é conhecida cientificamente – tem prestígio de sobra entre os músicos. E são eles que estão fazendo de tudo para que ela volte às nossas matas.

    “Na Europa, qualquer gravação de música erudita tem um pedaço do nosso país. Os grandes músicos só aceitam arcos de pau-brasil”, garante o cineasta Otávio Juliano. Diretor do documentário “A árvore da música”, ele rodou o litoral brasileiro e algumas regiões do Velho Continente para conversar com concertistas e archetários, os fabricantes de arcos. E constatou que a escassez da espécie é assunto corriqueiro nas salas de concerto.

    “Os melhores músicos da Europa estão a par do problema, e já fizeram até concertos beneficentes com o objetivo de arrecadar dinheiro para o plantio de mudas”. Do lado de cá do Atlântico, os últimos fragmentos da Pernambuco Wood, como é conhecida lá fora, estão espalhados pelo sul da Bahia e pelo norte do Espírito Santo. Mas o corte da madeira nativa está proibido desde 1987. A partir daí, os fabricantes de arcos tiveram que pensar em alternativas para não perder seu ganha-pão.

    “Vi que teria problemas se não criasse um sistema para poder usar o pau-brasil”, diz o archetário Marco Raposo, há 13 anos no ramo. Mal enveredou pela profissão e deu um jeito de plantar quase sete mil mudas num sítio em Cachoeiro de Itapemirim, no Espírito Santo. Enquanto elas não atingem o ponto ideal para o corte – quando estão em torno de seus 25 anos –, ele busca matéria-prima em outros locais. “É comum a gente obter a madeira de pontes, cercas, construções antigas feitas com o pau-brasil”, explica.

    Mas a preocupação é que, cedo ou tarde, essas fontes vão se esgotar. Descendente de alemão e produtor de arcos há quase quatro décadas, Floriano Renato Rupf passou quatro anos na Europa para aprender a técnica. Voltou com uma lição: “Os archetários têm de plantar, pois se terminarem os estoques, a profissão acaba. Não há nada que possa substituir o pau-brasil”.

    Descoberta pelo luthier francês François Tourte em 1775 como matéria-prima para os arcos, a espécie nunca mais foi abandonada pelos músicos. Para eles, a madeira sai na frente nos quesitos elasticidade, sonoridade e suavidade.

    Para que as futuras gerações de músicos possam ter o gosto de tocar com a Pernambuco Wood, os concertistas europeus estão se mobilizando por sua conservação. Há sete anos, reuniram-se com archetários e criaram a International Pernambuco Conservation Initiative (IPCI). O objetivo é enviar recursos para o Brasil, a fim de que sejam plantadas mudas para futuro corte.

    “A intenção deles é plantar cerca de 2,3 milhões de mudas”, diz Floriano Rupf. Nada mau para um povo que passou séculos botando a espécie abaixo. Os tempos são outros.  “Hoje, os europeus estão entre os grandes responsáveis pelas tentativas de preservar o pau-brasil”, conta Rupf.