Carta do Editor - Nº 14

Luciano Figueiredo

  • As duas belas ciganas estampadas na capa desta edição iludem. A presença secular dos gitanos em terras americanas esteve bem longe da serenidade que o pincel habilidoso do artista procura transmitir.

    O assunto merece destaque neste número da Revista de História, que cuidou de reunir vários estudiosos no dossiê “Medo e Sedução” para oferecer ao leitor uma aproximação com a cultura desta comunidade cujos sortilégios foram aprisionados pela tradição.

    As culturas confrontam suas diferenças de outros modos. Nesta edição, pode-se conhecer maneiras distintas de aproximação de culturas a partir de diferentes lugares, como o colégio, os bondes ou as ruas. Na escola, o papel do controle disciplinar motiva o artigo de Mariza de Andrade, que penetra nos segredos do Caraça, tradicional colégio mineiro. Ali os homens formados para dirigir a nação seriam ensinados a desprezar as seduções do mundo. Na literatura, Machado de Assis, em sua saborosa crônica apresentada aqui por Julia O’Donnell, mostra desconforto sob as tensões dentro dos bondes que cruzam os costumes cosmopolitas do Rio de Janeiro. O Estado não escapou dessa armadilha. Mauricio Parada revela em seu artigo a intensificação, durante o Estado Novo, dos jogos atléticos, que buscaram forjar nos homens a disciplina e a obediência.

    Sob o imenso caleidoscópio que se agita no tempo, experiências históricas como estas, de ajustes movidos por conveniências, vontades ou força, deixam ver que nem todos tiveram a sorte dos ciganos. Ainda assim, em movimentos confusos e ricos, as culturas escrevem seu inventário de diferenças. Diversidade é indispensável.

    Luciano Figueiredo