Contra a caricatura

Paulo da Costa e Silva

  • Comemorações dos 200 anos da chegada da Corte visam reabilitar a imagem de D. João VI

    Ao contrário do que se pensa, D. João – na época ainda príncipe regente – não veio tão “fugido” para o Brasil. Quem sustenta a tese é o pesquisador Kenneth Light, argumentando que a vinda da Corte portuguesa foi planejada com pelo menos seis meses de antecedência (ver Revista de História nº 14). Tanta antecedência parece ter contagiado a comissão responsável pelas comemorações dos 200 anos da chegada da família real ao Rio de Janeiro. Embora a data do bicentenário seja 2008, este ano já vai trazer uma série de publicações e concursos que pretendem sublinhar este episódio decisivo na história do país e da cidade do Rio.

    Decisivo porque em pouquíssimo tempo o Rio passaria de Colônia a capital do império português. A cidade receberia um grande impulso de crescimento e teria sua vida social profundamente transformada pelos novos hábitos da nobreza que chegava – as casas cariocas passam a ter cama com dossel, cristaleira, candelabros e espelhos. E, além de tudo, o Brasil ganharia a presença do rei.

    Não à toa, o slogan da comissão é “D. João VI no Rio”. O objetivo é celebrar a figura do rei português que, com o passar dos anos, teve seus méritos ofuscados pela força de sua caricatura. O presidente da comissão – o embaixador e historiador Alberto da Costa e Silva – caracteriza D. João VI como um monarca “cauto e paciente”. Para enterrar o mito de sua burrice e passividade, Alberto cita a frase de Napoleão – “Só duas pessoas me tapearam: o rei da Inglaterra e D. João VI” – e frisa o grande sentido cultural do rei, manifestado na construção do Jardim Botânico, da Biblioteca Nacional, da Impressão Régia, da Escola de Medicina e do Real Teatro São João, o primeiro do Brasil.
     
    Dando início às comemorações, serão lançados vários livros este ano – o primeiro, uma tradução inédita do diário de viagem de Thomas O’Neil, tenente da esquadra que trouxe a família real para o Brasil. Para 2008, além de novas publicações, estão previstos eventos, exposições, espetáculos musicais, um filme e até uma revista em quadrinhos sobre o período joanino. A comissão responsável pelas comemorações – da qual participam o secretário municipal das Culturas, Ricardo Macieira, e o secretário municipal do Patrimônio Histórico, André Zambelli – pretende também restaurar marcos históricos do período joanino, como a Antiga Sé e o monumento comemorativo dos 100 anos da abertura dos portos, na Glória.

    As comemorações do bicentenário vão até dezembro de 2008, quando será publicada a monografia vencedora do “Prêmio D. João VI” – que vai escolher o melhor livro inédito sobre o impacto da chegada da Corte ao Rio (mais informações no site comissaodjvi@pcrj.rj.gov.br).

    Com todo esse cartaz, D. João VI perde uma caricatura para ganhar um retrato.