Aparentemente, eles estão fechados em claustros, alheios aos acontecimentos externos. Mas os monges beneditinos abriram as portas do Mosteiro de São Bento da Bahia para os feridos da Guerra de Canudos no final do século XIX e para estudantes de esquerda durante o regime militar. Agora, o primeiro mosteiro beneditino das Américas está completando 430 anos, história lembrada no fim do ano passado com o lançamento do livro Mosteiro de São Bento da Bahia. Tem mais novidade: este ano será publicada na Internet a versão digital de cerca de 40 livros raros, e está sendo planejado o Museu do Livro Raro, para aproveitar um dos principais acervos do país.
“Temos 13.000 volumes no setor de obras raras. O mais antigo é de 1503 e tem encadernação monástica, toda em pergaminho. Temos também iluminuras, livros ornados, bordados a ouro e prata, com pedrarias... Já estão na Internet 20 volumes digitalizados, como as primeiras edições dos Sermões do Padre Antônio Vieira, dos séculos XVII e XVIII”, conta Alícia Duhá Lose, coordenadora geral de pesquisa do mosteiro e professora de Letras da UFBA.
O acervo bibliográfico e documental é tombado pelo Iphan desde 1985. Há livros de registros de bens, já que o mosteiro foi proprietário de muitos terrenos no Nordeste, e até uma caderneta com nomes dos feridos de Canudos recebidos pelos monges. “Há muita documentação para estudar escravidão no século XVII. É possível identificar nomes, famílias, quem era casado com quem, quantos eram. Nas pesquisas históricas, a ordem foi eclipsada pelos jesuítas, mas sua documentação pode ser muito útil para se estudar a relação dos mosteiros com a sociedade”, afirma Jorge Victor Souza, historiador da Universidade Severino Sombra e autor da tese “Para além do claustro: História social da inserção beneditina na América portuguesa, c.1580-c.1690”, defendida na Universidade Federal Fluminense no ano passado.
Informações sobre essa documentação, os diferentes estilos construtivos do mosteiro, o acervo de obras de arte – considerado o maior do país pelo Iphan – e os 2.000 anos de história beneditina estão no livro ricamente ilustrado. D. Gregório Paixão, monge e bispo auxiliar de Salvador, é o organizador da obra. “Nos anos 1990, começamos um projeto de revitalização, abrimos a biblioteca ao público e estamos divulgando toda essa riqueza de obras de arte, que vai desde o século XVII. São cerca de 5.000 itens, como ourivesaria, móveis e peças doadas pela família real”, conta o monge.
Até meados do século XVIII, o convento baiano foi o principal da ordem no Brasil. Por isso conseguiu reunir acervo tão grande. A história de sua fundação, no mesmo ano da chegada dos beneditinos ao Brasil, ainda é um tanto mítica. “Eles dizem que teriam vindo a pedido dos colonos, por questões de fé. Mas é claro que houve outros interesses. Os colonos queriam trazê-los para criar equilíbrio político com as outras ordens”, explica Souza.
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Livros raros: http://www.saobento.org/livrosraros/
Da clausura para o mundo
Cristina Romanelli