Entre homens e livros

Cristina Romanelli

  • Talvez nem 100 mil documentos, fotos e cartas sejam suficientes para se analisar a trajetória e a personalidade de um homem. Mas a presença de nomes como Guimarães Rosa, Getulio Vargas e Manuel Bandeira nesses registros dá pistas de que se trata de alguém importante.

    Pois é justamente 100 mil o número estimado de documentos do acervo José Olympio Pereira Filho. Para lembrar os 20 anos da morte do fundador da Livraria José Olympio Editora, que publicou os principais autores brasileiros do século passado, a Divisão de Manuscritos expõe até o dia 31 de maio parte da coleção inédita doada em 2006 à Biblioteca Nacional.

    “Foi uma loucura receber esse material. Não tinha lugar para colocar, fomos empilhando no canto”, conta a coordenadora do acervo, Ângela Di Stasio. A coleção foi doada pela família de Henrique Sérgio Gregori, amigo de Olympio que comprou a editora na década de 1980.

    “Encontramos imagens do século XIX utilizadas na ilustração dos livros, notas fiscais, provas de livros com correções feitas à mão e até um guardanapo de tecido”, diz Ângela. O acervo inclui algumas antiguidades, como a foto do último baile da Ilha Fiscal, feita por Marc Ferrez em 1889, mas a maioria dos documentos é do período entre 1930 e 1990.

     Na exposição “José Olympio – Uma instituição feita de homens e livros”, há fotos do editor com os presidentes Juscelino Kubitschek e Castelo Branco, um manuscrito com um soneto de Carlos Drummond de Andrade, esboços exclusivos de algumas capas de livros e a edição de 1932 de Conhece-te pela psicanálise, de Joseph Ralph, primeira publicação da editora.

    Além da importância de Olympio no cenário cultural, alguns documentos do arquivo revelam seu relacionamento com os membros da “casa”. Era assim que ele gostava de chamar a editora, já que, segundo a coordenadora do acervo, todos ali formavam uma grande família.
    “Olympio escrevia bilhetes com lápis de cera de várias cores. Isso mostra a relação de intimidade que tinha com os escritores e com irmãos e filhos que trabalhavam na editora. Além disso, o apelido J.O. foi criado por Gilberto Freyre, seu amigo próximo”, diz Ângela.
     Uma das cartas expostas é do escritor Ariano Suassuna. Nela, “ele abre mão dos direitos autorais até que as vendas de Pedra do Reino cobrissem os custos. Nem o próprio autor acreditava no livro, mas Olympio o publicou e o título virou um grande sucesso de Suassuna”, conta Monique Mathias, da equipe do acervo. 

    Segundo Frederico Ragazzi, também membro da equipe formada por quase metade do pessoal da Divisão de Manuscritos, cerca de 70% do material já foi analisado, mas não há previsão para a conclusão do trabalho. Assim que a análise for finalizada e revisada, a equipe espera elaborar um catálogo com todo o acervo e fazer outra exposição, maior do que a deste ano. Até lá, a única oportunidade para quem quiser ver alguns dos documentos é a mostra no terceiro andar da Biblioteca Nacional.