Estudos, memórias e beijos

Cristina Romanelli

  • Depois de horas de estudo e pesquisa, nada melhor do que namorar. Pelo menos era essa a ideia do antropólogo Darcy Ribeiro (1922-1997) ao idealizar, junto com o arquiteto João Figueiras Lima, o Lelé, o projeto do centro cultural que receberá seu acervo. Em frente a um palco a céu aberto, onde poderão ser realizadas serestas, leituras de teatro e de poesia, há uma arquibancada para mais de duzentas pessoas. Nesse local, apelidado por ele de “Beijódromo”, todos estão livres para namorar à vontade. O nome deu tão certo que virou apelido de todo o espaço. O Memorial Darcy Ribeiro será inaugurado na Universidade de Brasília (UnB) no dia 26 de outubro, quando o antropólogo completaria 88 anos.

    “Quando criou a Fundação Darcy Ribeiro, em 1996, seu sonho era que ela ficasse na UnB, sua filha querida. Ele idealizou a universidade e foi seu primeiro reitor”, lembra Paulo Ribeiro, sobrinho do antropólogo e presidente da fundação, que acabou sendo instalada no Rio de Janeiro. Quase quinze anos depois, todo o acervo pessoal de Darcy está de malas prontas para Brasília. Entre as raridades está a única película do filme em 35 mm produzido por ele e pelo cineasta Heinz Foerthmann entre os índios Urubu-Kaapor em 1949. O acervo inclui ainda projetos, correspondências, planos de aula, palestras, vídeos e entrevistas. Tudo isso estava arquivado no Rio de Janeiro, com acesso só permitido a estudantes de mestrado e doutorado.

    Espalhadas pelos dois andares do memorial, que parece tanto uma oca indígena como um disco voador, estarão obras de arte que pertenceram ao antropólogo. O local terá cineclube, galeria de arte, jardim interno, cafeteria, livraria, sala de informática e biblioteca com 30 mil volumes que faziam parte da coleção de Darcy e de sua primeira mulher, Berta Gleizer Ribeiro. Também antropóloga, ela trabalhou com o marido no projeto de criação do Parque Nacional do Xingu, em 1961, e escreveu o livro Diário do Xingu (Paz e Terra, 1979), com depoimentos sobre o convívio com os índios da região.

    É difícil encontrar uma pessoa que nunca tenha ouvido falar de Darcy Ribeiro, seja em nome de prêmio, de fundação, de escola de cinema, de universidade. Mais difícil ainda é achar alguém que saiba definir quem foi ele. Antropólogo é pouco. Ele foi educador, imortal da Academia Brasileira de Letras, ministro da Educação, senador da República... Darcy lutou pela cultura indígena, pela educação, e desempenhou muitas funções, a maioria delas sem nome. Mas a irreverência, que também era sua marca registrada, está presente no memorial. Seja para namorar ou para estudar, o Beijódromo é um presente e tanto para os 50 anos de Brasília e da UnB, que completa a mesma idade em 2011.