Fim da disputa

Cristina Romanelli

  • Brasil, 10 de abril de 1832. “Após outra longa cavalgada, chegamos ao local em que dormiríamos, Campos Novos. Foi uma noite muito fresca e agradável. O termômetro na grama marcava 74º [23ºC]. Saí para coleta e encontrei algumas conchas de água doce.” Assim escreveu o naturalista Charles Darwin (1809-1882) sobre sua passagem pela região da Fazenda Campos Novos, em Cabo Frio, no estado do Rio de Janeiro, durante a segunda expedição feita pelo navio HMS Beagle. A fazenda foi tombada pelo Iphan no final do ano passado e é a sede da Secretaria de Agricultura do município. Este ano, está sendo planejada a restauração e a nova utilização de sua estrutura, seja como parque agroecológico ou como extensão do campus de uma universidade rural.

    “Nosso grande sonho é restaurá-la, pois a construção já está decadente em algumas partes. Vamos também fazer todo o procedimento necessário para encontrar possíveis sambaquis no terreno. Arqueólogos já nos indicaram essa possibilidade. Quanto aos projetos de utilização da casa, estamos abertos a diversas opções. Pensamos até em torná-la sede do geoparque que será criado na Costa do Sol”, explica o historiador Jonatas Carvalho, pesquisador da fazenda.

    A fazenda está incluída no roteiro cultural “Caminhos de Darwin”, com 12 municípios por onde o naturalista passou, mas sua importância vai muito além do visitante ilustre. Ela começou a ser erguida no final do século XVII e foi uma das oito fazendas e engenhos da Companhia de Jesus localizados onde hoje é o estado do Rio de Janeiro. “A fazenda de Campos dos Goytacazes era uma das que produziam mais gado. Os animais saíam de lá e paravam em Campos Novos para engordar”, conta Márcia Amantino, historiadora do Programa de Pós-Graduação da Universidade Salgado de Oliveira. Esta foi uma das principais funções da fazenda até 1759, quando o marquês de Pombal decretou a expulsão dos jesuítas do Império e o sequestro de todos os seus bens.

    Márcia encontrou inventários da Coroa há cerca de três anos, com todos os bens desta e de outras fazendas da Companhia. “A documentação foi feita em três vias, estava na Torre do Tombo, em Portugal, e também no Ministério da Justiça, no Rio de Janeiro. Campos Novos tem um inventário de 1759 e outro de 1775, com números sobre gados, plantações, edificações, descrição das igrejas e informações sobre os escravos, com organização familiar, idade, sexo, ocupação e às vezes até valor”, diz a historiadora.  

    A Coroa vendeu a fazenda em 1778. Desde então ela passou de mão em mão, e teve sérias questões agrárias no século XX. “Tinha disputa com posseiros. Até os descendentes de escravos estavam no meio, pois ganharam terra dos antigos donos. Em 1988, o sindicalista rural Sebastião Lan foi assassinado. Mas, desde 1993, quando a prefeitura desapropriou a fazenda, tudo está mais tranquilo e os quilombolas foram reconhecidos”, conta Carvalho. Os remanescentes de quilombolas moram na região, muitos trabalham na fazenda e querem permanecer por lá. Eles já têm até espaço garantido no mesmo cemitério usado desde o século XVIII pelos jesuítas e pela elite local.

    Saiba Mais

    Fazenda Campos Novos: Rodovia Amaral Peixoto, km 123 – Cabo Frio. Visitas de segunda a sexta em horário comercial. Telefone: (22) 2625-6162