Foice, martelo e rotativa

  • Durante a década de 1950, a Rua Leôncio Albuquerque era o ponto de partida do comunismo no país. Localizado na Gamboa, Zona Portuária do Rio de Janeiro, o casarão colonial número 34 abrigava a gráfica do Partido Comunista Brasileiro, responsável pela publicação de vários periódicos, como A Tribuna Popular. Em breve, este e outros materiais voltarão ao local onde foram publicados para compor o acervo do Museu da Imprensa Comunista.

    Criado em 25 de março de 1922, o PCB é o partido mais antigo em atuação no país. Uma de suas dissidências, o Partido Popular Socialista (PPS), foi responsável pela proposta de criação do memorial. “A cadeia da imprensa do PCB abarcava jornais em São Paulo, Recife, Bahia, Porto Alegre e outras cidades. Em extensão, comparava-se aos Diários Associados, mas claro que não em tiragem e poderio”, comenta Givaldo Siqueira, membro da executiva nacional do PPS.

    A imprensa comunista chamava a atenção dos intelectuais e do grande público. A Tribuna Popular, fundada em 1945, teve Carlos Drummond de Andrade como um de seus primeiros diretores. O jornal tinha tiragem diária de 30 mil exemplares, chegando a atingir 50 mil no ano seguinte. Marca que também seria alcançada pelo semanário Novos Rumos.

    A polícia acompanhava de perto toda essa produção. Prisões e empastelamentos faziam parte da rotina da imprensa comunista. Antes da mudança para a Gamboa, os confrontos chegaram às vias de fato. “À época do governo Dutra, comandados por Salomão Malina, os companheiros resistiram, armados, a uma invasão realizada pelo Dops. Após se renderem, foram barbaramente espancados, processados e condenados”, conta Givaldo, que é filiado ao PCB há mais de meio século.

    Mesmo avessa ao capitalismo, a imprensa vermelha não dispensava a propaganda em suas páginas. Alguns produtos buscavam se aproximar da causa, como o “Sabão Russo” e o perfume “Cavaleiro da Esperança”, em homenagem a Luís Carlos Prestes (1898-1990), o mais notório comunista do país.

    Além de periódicos, a gráfica imprimia livros e materiais de propaganda. E o museu pretende ir além das letras, abrigando uma genealogia de líderes populares e registros visuais, como a microfilmagem da participação brasileira na Terceira Internacional Comunista, em 1919. Ironicamente, o registro foi doado ao PCB por um dos responsáveis pelo fim da União Soviética, o ex-presidente Mikhail Gorbachev.

    Com o golpe militar, as impressões no casarão cessaram. Foram retomadas somente em 1989, já sem a mesma penetração de outrora, e pararam novamente poucos anos depois. O projeto do museu depende ainda da remissão das dívidas do imóvel, e conta com financiamento municipal para dar início à reforma.

    Doações e contribuições para o Museu da Imprensa Comunista podem ser feitas por intermédio da Fundação Astrojildo Pereira (www.fundacaoastrojildo.org.br).