O Brasil bem na foto

  • Foram necessários apenas cinco meses para que a técnica fotográfica, anunciada em Paris por Louis-Jacques Daguerre em agosto de 1839, chegasse ao Brasil. Por aqui, graças em grande parte ao entusiasmo e estímulo de d. Pedro II, a fotografia se desenvolveu com grande rapidez e qualidade, atraindo profissionais de toda a Europa. Agora, a fotografia faz o caminho inverso. A mostra O império brasileiro e seus fotógrafos (L`empire brésilien et ses photographes), em exposição no Musée d’Orsay, em Paris, um dos mais importantes da Europa, apresenta até o dia 4 de setembro um panorama da fotografia brasileira oitocentista. Trata-se da primeira mostra com tema sobre o Brasil acolhida pelo museu francês. As 100 imagens reunidas, parte dos acervos da Biblioteca Nacional e do Instituto Moreira Salles, foram escolhidas como as mais representativas do período. “A fotografia produzida nessa mesma época na Índia, Egito e China é amplamente conhecida na Europa. A brasileira ainda não. Nos últimos 20 anos, esforços de pesquisadores, colecionadores e curadores brasileiros têm sistematizado o conhecimento da nossa produção fotográfica e permitem, hoje, que o país apresente uma mostra dessa importância”, sublinha Pedro Corrêa do Lago, presidente da Biblioteca Nacional e responsável pela seleção das imagens ao lado do fotógrafo brasileiro radicado nos Estados Unidos, Vik Muniz, e da curadora-chefe do d’Orsay, Françoise Heilbrun.

    A exposição parte das experimentações fotoquímicas do francês Hercules Florence, que em 1833 produziu, na pequena cidade de São Carlos (atual Campinas), as primeiras imagens fotográficas e que, com essa exposição, tem o seu papel pioneiro nas Américas reconhecido de maneira definitiva. A mostra segue apresentando as diversas paisagens brasileiras, urbanas e tropicais; as feições do povo, do escravo ao imperador; os arranjos sociais, registrados, por exemplo, em imagens do trabalho escravo em fazendas de café, feitas por Victor Frond; as expressões da cultura popular, exemplar na cena da Congada, de autoria de Arsênio da Silva; e os sinais do progresso, expressos nas documentações de construções de ferrovias e estradas. Nesse sentido, as imagens produzidas por Revert Henrique Klumb, da estrada União e Indústria, são exemplares do desenvolvimento do país.

    Fica estampado, assim, um Brasil plural e em transformação. O crescimento urbano do país é exemplar na documentação de Militão Augusto de Azevedo sobre São Paulo, feita em dois diferentes momentos: em 1862 e 1887. O material – vertido em um álbum comparativo – testemunha o início do desenvolvimento da capital paulista, ainda povoada por casas baixas e algumas dezenas de ruas.

  • A mostra reúne trabalhos de 26 grandes fotógrafos do período, como Marc Ferrez, Augusto Stahl, Revert Henrique Klumb, Georges Leuzinger, Guilherme Gaensly, Joaquim Insley Pacheco e Albert Frisch. Há ainda fotografias produzidas por seis anônimos, como a que estampa uma senhora finamente vestida e penteada, sentada em uma liteira, na Bahia, com dois escravos à sua volta: um respeitoso e cordial, outro displicentemente apoiado, com a mão na cintura, na haste da cadeira. A cena é exemplo bem acabado do papel desempenhado pela fotografia do século XIX, a meio caminho entre a arte e o documento.

    Alguns mestres da fotografia brasileira do século XIX

    Marc Ferrez: O brasileiro Marc Ferrez participou, em 1875, da Comissão Geográfica e Geológica do Império, sob direção de Charles Frederick Hartt, período em que registrou diversos aspectos das paisagens e do povo brasileiro. A experiência marcou de forma definitiva sua obra, umas das mais abrangentes do século XIX. Ferrez é um dos nomes de destaque da fotografia de paisagem do período.

    Augusto Stahl: O fotógrafo francês é dono de uma produção diversificada no tema e homogênea no que se refere à qualidade estética. Entre as imagens de sua autoria, consta na mostra uma panorâmica da cachoeira de Paulo Afonso, feita em 1860 e tida como divisor de águas da fotografia de paisagem, devido à sua composição ousada e ao avanço técnico que representou para a época.

    Revert Henrique Klumb: Professor de fotografia da Princesa Isabel, o alemão documentou fartamente a capital do Império, produzindo vistas urbanas e naturais, além de Petrópolis e da estrada de rodagem União e Indústria. É autor do guia de viagem Petrópolis–Juiz de Fora, Doze horas em diligências, dedicado à imperatriz Thereza Christina.

    Guilherme Gaensly: O fotógrafo suíço desenvolveu seu trabalho fotográfico em dois importantes períodos. O primeiro deles, na Bahia, onde documentou diversos aspectos da cidade de Salvador. A partir da década de 1890, transfere-se para São Paulo e dá início a uma série de vistas da cidade, documentando o crescimento urbano, social e econômico estimulado pela prosperidade do café.

    Joaquim Insley Pacheco: Um dos mais atuantes retratistas do Brasil oitocentista, Joaquim Insley Pacheco notabilizou seu trabalho principalmente em imagens da família imperial e de personagens da elite da capital. Um retrato se destaca na sua obra, o que apresenta d. Pedro II em meio a um exuberante cenário tropical, montado especialmente em seu estúdio.