Onde a cultura vale

Juliana Barreto Farias

  • O Vale do Jequitinhonha, no nordeste de Minas Gerais, ainda é uma das regiões mais pobres do Brasil. Mas já se foi o tempo em que os moradores do lugar tinham vergonha de revelar sua origem. Desde a década de 1970, quando quatro amigos do Vale iniciaram um trabalho de recuperação da identidade local, a vida da população se transformou. E continua se transformando com os festivais culturais que movimentam a região todos os anos.

    Foi em 1977 que Tadeu Martins, Carlos Figueiredo, George Abner e Aurélio Silby decidiram percorrer os municípios do Jequitinhonha dispostos a mudar a precária realidade do “Vale da Miséria”, como era conhecido na época. Um dos primeiros resultados dessas andanças foi a realização, na cidade de Itaboim, do Festival de Cultura Popular do Vale, o Festivale. O sucesso foi tanto que a iniciativa se espalhou por mais 18 cidades e virou um evento fixo no calendário do Vale. “Hoje, o Festivale é muito mais que um encontro de uma semana para celebrar a cultura. É a reunião de pessoas que acreditam na transformação através da arte, da dança, da música, da poesia e do tambor que timbra para além das montanhas das Minas Gerais”, afirma José Claudionor dos Santos Pinto, diretor executivo da Fecaje, Federação das Entidades Culturais e Artísticas do Vale do Jequitinhonha, que desde 1991 organiza o festival.

    Durante os dias festivos, acontece de tudo: shows com artistas populares, feiras de artesanato, culinária, mostras de vídeos, fotografias, declamação de poesias, roda de violeiros, oficinas de xilogravura, literatura e cerâmica, cursos e debates sobre arte e cultura. O ponto alto é a apresentação dos Grupos de Cultura Popular pelas ruas da cidade-sede (que muda a cada ano) do festival. Famílias inteiras vêm das zonas rurais para dançar a congada, a folia de reis, a trança de fitas e os catopés. Também não faltam ações educativas, como o projeto Pedagogia Itinerante, desenvolvido por alunos do Centro Universitário de Belo Horizonte, que já realizou oficinas de formação para professores e funcionários da rede pública de ensino.

    “A mobilização comunitária no Jequitinhonha, que garante a participação anual no Festivale, bem como os eventos culturais que ocorrem ao longo de todo o ano, têm provocado nas pessoas orgulho de pertencer a essa região tão adversa, mas culturalmente tão rica”, assinala José Claudionor. E desde que a Fecaje ganhou, em 2008, o Prêmio Rodrigo Melo Franco, concedido pelo IPHAN, esse sentimento só faz crescer. Prestes a ganhar uma sede própria, na cidade de Araçuaí, eles estão prontos para timbrar seus tambores muito além das montanhas de Minas.