Marcos de Carvalho não quer saber das capitais. Cineasta autodidata, o pernambucano de 41 anos passou os últimos meses enfiado em municípios como Quixadá, Itarema, Quixeramobim e Assaré. Todos no Ceará. A próxima etapa é desbravar povoados rurais do Piauí. À frente do projeto Cinema no Interior, de sua autoria, ele está há mais de dez anos documentando um Brasil que não aparece nos mapas. E, a julgar pelos apoios que tem angariado, não deixa as estradas tão cedo.
Só em Pernambuco, foram dez municípios visitados e treze documentários produzidos, que falam de Luiz Gonzaga a manifestações folclóricas que só se veem por ali. A escolha dos temas e o registro audiovisual ficam por conta de alunos e professores da região.
“Normalmente, escolhemos uma escola e apresentamos o projeto. Pedimos que façam uma redação e nos contem o que o local tem de interessante para ser trabalhado num filme”, diz. “Entregamos os equipamentos e eles aprendem tudo na prática: enquadramento, iluminação, foco. A gente vai atrás, coordenando”.
Segundo Marcos, que acabou criando a produtora Mont Serrat Filmes para tocar o projeto, a iniciativa tem incentivado essas populações a valorizar a cultura local. “Quando os filmes ficam prontos, reunimos as pessoas dos diferentes povoados, instalamos um telão para assistir ao resultado e confraternizamos. É algo mágico, pois convivemos com manifestações feitas de uma forma muito original, nativa”, conta ele, citando a festa que os descendentes do poeta Patativa do Assaré fizeram ao se reencontrarem.
O início foi difícil: “Toquei a primeira fase do projeto com recursos próprios”, conta. Mas ele não desistiu. Em cada município que pisava, batia à porta de prefeituras, governos estaduais e do Exército para pedir apoio logístico. Tanto insistiu que suas lentes já foram da Amazônia às serras gaúchas, passando pelo litoral, pelo planalto e pelo Pantanal. Desde 2006, porém, o projeto tem vencido sucessivos editais, dando uma pequena folga no orçamento.
“A ideia original é deixar uma espécie de núcleo de produção audiovisual após passarmos pelos lugares. Com esses apoios, vamos conseguir fazer isso”, comemora Marcos, ao explicar os critérios que orientam suas viagens. “Procuramos sempre os municípios menores. Quanto mais do interior, melhor, porque é ali que temos a grande essência da cultura brasileira preservada. E é ali também que há maior carência de iniciativas culturais”.
Os desafios, no entanto, não ficaram para trás. Para chegar aos destinos, ainda é preciso enfrentar noites em claro, equipamentos furtados, carro atolado... Mas ele nem pestaneja quando lhe perguntam se o esforço vale a pena. “A gente vem perdendo rapidamente muitas riquezas culturais. Dessa forma, pelo menos, alguma coisa fica registrada”.