Entre as mais de 40 mil imagens que integram o acervo de fotografia da Biblioteca Nacional, 44 servem como um verdadeiro raio X do edifício inaugurado em 1910. Guardado na Divisão de Iconografia, o Álbum da Construção da Biblioteca Nacional revela todas as etapas da obra e as técnicas de engenharia capazes de surpreender arquitetos e engenheiros do século XXI. A surpresa pode surgir ainda na fase inicial da obra que durou de 1906 a 1910: todo o edifício é feito a partir de uma estrutura metálica.
As imagens mostram armações de ferro de 44 metros de altura que, após receber os revestimentos de alvenaria, sustentam os 13 mil metros quadrados de área útil da Biblioteca, cujo projeto foi assinado pelo então engenheiro militar Francisco Marcelino de Souza Aguiar. Segundo o chefe do Núcleo de Arquitetura da BN, Luiz Antônio Lopes de Souza, o prédio é um exemplo do início de uma nova indústria da construção. “A estrutura metálica agiliza a edificação. Para a época, isso foi um grande sinal de avanço”, diz o arquiteto.
A técnica usada há quase um século ainda pode ser considerada uma ousadia. O arquiteto Ernani Freire, que desenvolve atualmente um projeto que pretende dinamizar as consultas dos usuários da BN, chama a atenção para esse fato: “Eu fiquei muito surpreso quando vi essas fotos porque, mesmo em 2005, esse tipo de construção não é tão comum no Brasil. Nos EUA é mais fácil encontrar obras feitas a partir de armações, mas aqui é raro”, compara Freire.
-
Mas a Biblioteca Nacional não foi o único projeto do Rio de Janeiro que contou com estruturas metálicas nessa mesma época. Segundo o engenheiro Geraldo Filizola, que desenvolveu um projeto de mezanino em ferro para a BN este ano e teve acesso ao álbum recentemente, o castelo mourisco da sede da Fundação Oswaldo Cruz e o Teatro Municipal também têm estrutura metálica. “Mas o que se destaca na construção da Biblioteca é que toda ela foi projetada para esse tipo de estrutura. Normalmente, os edifícios dessa época não contavam com ferro nas paredes, apenas nas lajes e, alguns, no piso”, afirma Filizola.
O projeto arquitetônico acompanhou a importância histórica da engenharia. O edifício é um dos exemplos do momento eclético do início do século XX, assim como o Museu Nacional de Belas-Artes e o Teatro Municipal. Elementos art nouveau, como um quadro de Visconti, e uma linguagem neoclássica, como as paredes externas rústicas do térreo, são encontrados no prédio. “Ele é resultado de uma colagem de diversos estilos históricos da arquitetura, antecedendo o modernismo”, diz Luiz Antônio Lopes de Souza, que qualifica a Biblioteca Nacional como um monumento que sobreviveu às modernizações urbanas do Rio de Janeiro.
O tombamento do edifício, decretado em 1973, contribuiu para a resistência do prédio ao tempo e o Álbum, para a sua memória. “Mais do que a técnica de engenharia da Biblioteca, o que me impressionou foi o registro dessa obra. Eu não conheço uma documentação sobre a construção de um prédio tão farta quanto essa”, declara Filizola.
Prédio eclético em base moderna
Revista de História