Projetar para provocar

Angélica Fontella

  • Forte de Monte Serrat é iluminado com projeção de uma fotografia de Claude Santos. (DIVULGAÇÃO / FOTO: CLAUDE SANTOS)Quem passou pelo Porto da Barra, em Salvador, entre março e maio deste ano, teve uma surpresa: o Forte de Santa Maria, construído em 1624, estava com um novo colorido. Imagens do Descobrimento, da chegada de Tomé de Souza e da Invasão Holandesa apareciam, desapareciam e se misturavam com fotografias da Bahia de hoje, todas projetadas na estrutura do monumento. 
     
    A intervenção faz parte do projeto “Poemas Visuais: Intervenções urbanas com projeções”, idealizado pelo fotógrafo Claude Santos. “Pensei em fugir da projeção tradicional e dar um clima de grafite – imagens que ocasionalmente vemos e ficam, ou não, na nossa memória. Não precisamos parar para contemplá-las, estamos de passagem e elas apenas nos provocam”, explica.
     
    Outros dois monumentos receberam as projeções: a Igreja de Santana, no bairro do Rio Vermelho, e o Forte de Monte Serrat. As 21 imagens selecionadas foram colhidas nos acervos do Museu de Arte da Bahia, do projeto “Memória em Película” da TVE Bahia, da Fundação Gregório de Mattos e da Biblioteca Nacional. Claude Santos editou os “Poemas Visuais” com aproximadamente seis minutos de exibição, que se repetiam (em looping) durante quatro horas à noite.
     
    “A primeira projeção que vi foi sem querer, no Porto da Barra, de passagem mesmo. Gostei e me programei para ver a projeção em Rio Vermelho. Ao contrário da primeira, fiquei parada, viajando naquilo que estava passando”, conta Célia Aguiar, funcionária da Secretaria de Cultura da Bahia e moradora do Rio Vermelho. “Achei bem bacana essa proposta do Claude, que é trazer a imagem com o seu elemento de memória, principalmente projetada em locais históricos, gerando diálogo entre moderno e antigo”, completa.
     
    O fotógrafo pesquisa a história baiana desde os anos 1970 e a escolha das imagens está diretamente relacionada aos monumentos. “Todos os Poemas Visuais têm como tema fatos históricos ligados aos locais de projeção. No Forte de Santa Maria, a chegada de Tomé de Souza. Na Igreja de Santana, a colônia de pesca e o local da devoção a Iemanjá. No Forte de Monte Serrat, o testemunho da Invasão Holandesa e a entrada do Recôncavo, de onde vinham os alimentos e os utensílios que abasteciam a cidade”, detalha.
     
    Os três monumentos foram pincelados virtualmente com imagens de artistas do século XIX, como Johann Moritz Rugendas e Benjamin Robert Mulock. Além disso, foram projetadas cenas do filme Entre o Mar e o Tendal, de Alexandre Robatto Filho (1952/1953), sobre a vida e o trabalho do pescador, intercaladas com filmagens do próprio Claude Santos durante rituais de Iemanjá, e do filme Um Dia na Rampa, de Luiz Paulino dos Santos (1960), sobre saveiristas e mercadores, em fusões com imagens históricas de índios e escravos e retratos do povo baiano. 
     
    Construções históricas foram tela para a projeção de imagens históricas antigas e atuais. (DIVULGAÇÃO / FOTO: CLAUDE SANTOS)