Tratamento intensivo

Cristina Romanelli

  • As conservadoras-restauradoras Elizabeth da Costa e Kátia Sandes reparam partituras do músico João Pizarro na nova sala.O Dicionário Cravo Albin da Música Popular Brasileira se refere ao compositor Antônio dos Santos Chirol (1847?-1910) como autor de “muitas polcas e lundus, infelizmente perdidos”. Nem todos. A partitura da polca “Não há mais escravos”, composta em comemoração à assinatura da Lei Áurea, está na recém-criada Área de Conservação da Biblioteca Nacional, instalada no Palácio Gustavo Capanema, no Centro do Rio de Janeiro. Também passou por lá o contrato de cessão de direitos da composição “Oh! Não me iludas”, de Chiquinha Gonzaga (1847–1935), para a editora Bevilacqua e Cia. “Eu suspeitei que o contrato estava guardado em um envelope que poderia danificá-lo. Chamei a equipe de conservação, e eles resolveram tudo na mesma hora”, diz Elizete Higino, coordenadora da Divisão de Música e Arquivo Sonoro (Dimas).

    A partitura de Chirol e o contrato de Chiquinha Gonzaga irão integrar, com vários outros documentos, as exposições em comemoração ao bicentenário da Biblioteca Nacional, em novembro. Por isso, a Área de Conservação está correndo contra o tempo em sua nova sala, instalada fora da sede da instituição. Inaugurada no fim de maio, ela atende os acervos da Dimas e da Biblioteca Euclides da Cunha (BEC), que ficam no mesmo prédio. “Tivemos a ideia de criar esse espaço há muitos anos, mas não havia um local disponível”, conta Jayme Spinelli, coordenador de Preservação. Segundo ele, foi só com a transformação da antiga sala de depósito que os técnicos puderam se estabelecer no edifício.

    Com isso, os acervos da BEC e da Dimas, com partituras, livros, discos e documentos, não precisarão mais ser transportados até a sede da BN. Embora a distância entre os prédios seja de apenas três quarteirões, o trajeto não era simples de ser feito. “Antes, nós tínhamos que agendar um dia, com antecedência, para o carro levar a obra. Agora, podemos transportar vários volumes a qualquer hora, e o material fica distante menos tempo”, diz Elizete Higino.

    A nova Área de Conservação também proporciona mais segurança ao acervo, que agora corre menos risco de sofrer danos no percurso. Um grande alívio para a equipe que lhe dedica tantos cuidados. Os seis funcionários que trabalham na nova sala fazem questão de ressaltar: eles não restauram, mas conservam as obras. Reparam pequenos estragos, causados pelo manuseio ou pela idade do material, que começa a amarelar e quebrar. Para Elizabeth da Costa, conservadora-restauradora da BN há mais de 30 anos, o trabalho deles pode ser comparado ao que se faz em um hospital. “Os livros são como pacientes. Alguns vêm com menos problemas; outros vêm mais quebradiços. Fazemos a mesma coisa que os médicos, que tentam descobrir a causa da dor das pessoas”.