Um fotógrafo brasileiro

Vivi Fernandes

  • Em 1951, o fotógrafo piauiense José Medeiros publicava pela primeira vez na imprensa brasileira imagens de um ritual de candomblé. As cenas ficaram imortalizadas na reportagem A noiva dos deuses sanguinários, da revista O Cruzeiro. Medeiros (1921-1990) foi verdadeiramente um repórter fotográfico. Viajou por quase todo o país inventariando, com uma câmera na mão - a cultura, as paisagens e a gente do Brasil. Hoje seu acervo, com cerca de 20 mil imagens, entre negativos e fotos em papel, está sendo catalogado pela equipe de fotografia do Instituto Moreira Salles, que adquiriu a coleção em agosto último. Para o coordenador da área de fotografia do IMS, Sergio Burgi, o acervo é rico em quantidade e qualidade. “A maioria das imagens são dos anos 1940, 1950 e 1960, período em que José Medeiros esteve muito ativo na imprensa”, afirma Burgi.

    Muito do que está nesse acervo poderá ser visto nas páginas do livro Olho da rua – o Brasil nas fotos de José Medeiros, de Leonel Kaz (Aprazível Edições), que chega às livrarias ainda este mês. As pesquisadoras Nadja Fonseca Peregrino e Ângela Magalhães conhecem de perto essas fotografias. Em 1987, realizaram a curadoria da exposição e do catálogo José Medeiros 50 anos, no Rio de Janeiro. Em 1998, com o patrocínio de uma bolsa da RioArte, elas se debruçaram sobre o acervo por mais dois anos, o que resultou na exposição José Medeiros: a aventura moderna, que aconteceu de junho a agosto deste ano no Espaço UFF de Fotografia, em Niterói. “Ele foi genial porque liderou um estilo de reportagem com fotografias mais espontâneas, mais próximas do francês Cartier-Bresson”, afirma Nadja.

    Quando chegou ao Rio, em 1939, José Medeiros começou a fotografar para as revistas Tabu e Rio. Mas foi na O Cruzeiro que o fotógrafo se firmou como um dos mais atuantes e inovadores fotojornalistas brasileiros, produzindo grandes reportagens, muitas delas de cunho etnográfico.“A cultura afro-brasileira aparece como uma das principais vertentes de sua obra”, destaca Nadja Pelegrino.

  • Para Sergio Burgi, a qualidade do trabalho de José Medeiros – seja em relação à forma de abordar o fotografado ou nas técnicas utilizadas, como a iluminação suave – fez com ele se tornasse um fotógrafo de cinema. A falecida, de Leon Hirszman, e Memórias do Cárcere, de Nelson Pereira dos Santos, são alguns dos filmes que o consagraram como fotógrafo do Cinema Novo.

    A digitalização do material será feita ao longo do primeiro semestre de 2006, mas os pesquisadores já vão poder consultá-lo por meio de solicitações prévias a partir de janeiro. A compra do acervo de José Medeiros faz parte do projeto do IMS de reunir grandes nomes da fotografia do país. Ao todo, 170 fotógrafos integram as coleções do instituto, como os mestres do século XIX, como Marc Ferrez e Augusto Stahl, e do século XX, como Alice Brill – cuja obra está exposta no IMS de São Paulo até fevereiro de 2006 – e Marcel Gautherot.