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Bruno Garcia

  • As trincheiras, tão comuns no nosso imaginário sobre as guerras, tornaram-se conhecidas apenas depois da Primeira Guerra Mundial. Elas tiveram seu prelúdio na Guerra dos Bôeres, em 1899, quando colonos holandeses e franceses enfrentaram o exército britânico na África do Sul, mas foi na Europa que sua aplicação se deu de forma extensa e sistemática. Obras de uma engenharia militar em franca ascensão, eram abrigos temporários cavados na terra, em geral com não mais que dois metros de altura. Muitas se estendiam por centenas de quilômetros, demarcando no solo o lugar exato das frentes de guerra. Com o tempo, algumas ganharam cozinhas e sofisticadas divisórias internas.

    Quando ficou claro que a guerra não se resolveria tão rapidamente quanto se esperava, as trincheiras começaram a se multiplicar. Por um lado, protegendo batalhões impedidos de avançar pela presença de inimigos estacionados em suas próprias linhas; por outro, colocavam a artilharia de inimigos frente a frente.  Em batalhas sangrentas, rivais disputavam palmo a palmo pequenos pedaços de terra a um custo humano inimaginável. Não surpreende que a Primeira Guerra Mundial tenha sua história tão atrelada a essa experiência. A expressão Guerra de Trincheira foi cunhada precisamente para definir o período entre 1915, quando ficou claro o equilíbrio sangrento entre potências militares industrializadas, e 1917, quando a entrada dos Estados Unidos desequilibrou o conflito. No final, quase 20 mil quilômetros de trincheiras haviam sido cavados em solo europeu, uma distância equivalente a uma viagem de ida e volta do Rio de Janeiro a Paris.

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    Cavando, percorrendo ou esperando, eram nessas fortificações improvisadas que os soldados passavam a maioria do seu tempo. A fotografia de 1916, colorizada posteriormente, mostra soldados franceses em seu habitat mais comum. Descontraindo, mas sempre protegidos contra o fogo inimigo, enrolam cigarros e jogam conversa fora. Em períodos de calmaria, como o retratado, podiam simular uma vida normal. Jogavam cartas, escreviam para os familiares ou apenas desfrutavam do precioso descanso. Mas, em grandes batalhas, temiam não apenas a artilharia inimiga, sempre a postos a acertar o primeiro desprevenido que arriscasse  levantar a cabeça,  mas também bombardeios e granadas que muitas vezes transformava inteiras trincheiras em covas coletivas.

    O resultado da Primeira Guerra, em números absolutos, pode ser inferior ao da segunda. Mas, em solo europeu, a expressão Grande Guerra permanece atrelada ao conflito de 1914. Uma carnificina sem precedentes. No dia 1º de julho de 1916, para se ter uma ideia, o exército britânico perdeu cerca de 60 mil soldados na Batalha do Somme. Nas trincheiras, pereceram inteiras gerações de homens em idade militar, abrindo feridas que sangrariam ainda mais nas décadas seguintes. O término do conflito não resultou em paz, e a guerra em que todos perderam foi apenas o primeiro capítulo do século mais sangrento da história.